Substituição total?

Talvez seja importante voltar um pouco atrás nos pensamentos e esmiuçar o objectivo do VA na sociedade. Se no passado demos extrema importância à velocidade e ao transporte colectivo, hoje exploramos a tecnologia numa direcção diferente. Estamos a um passo de substituir a condução humana por um sistema automatizado. Mas porquê?

Um primeiro ponto de vista pode sugerir “porque podemos”. Estamos numa era em que os componentes necessários estão desenvolvidos ou em fase avançada de desenvolvimento e podemos explorar esta questão. Não nos parece ser uma reposta em si mesma. No entanto, é um caminho que passa muitas vezes entre as gotas da chuva sem avaliarmos as reais consequências da implementação destas tecnologias.

Podemos abordar esta pergunta de outro ponto de vista; a condução de um veículo pode ser uma actividade monótona. E automatizar um processo repetitivo tem vindo a ser uma tarefa indispensável dos nossos tempos. “Tempo vale dinheiro” – e no VA podemos aproveitar o tempo que estaríamos a despender a conduzir para realizar outras tarefas que nos motivam mais do que a condução. No entanto, não se pode impedir uma pessoa, num futuro próximo ou longínquo, de optar por condução manual. Qualquer pessoa deve ter o direito a não querer usar a tecnologia. Este é um tema que pode ser pouco consensual quando entramos na esfera do bem comum, apoiado pelo próximo argumento.

O terceiro argumento para adoptar o VA é a redução drástica de acidentes nas estradas. No entanto, este argumento parece frágil em determinados ângulos. Alguns autores defendem que a taxa de sinistralidade diminui com a chegada dos VA porque a grande fatia dos acidentes são causados por erro humano na condução16; no entanto, outros autores defendem que a sinistralidade pode até piorar num período de transição em que veículos tradicionais e autónomos partilham a estrada17. Se formos buscar atrás a questão do direito à condução manual então o período de transição pode ser eterno e deita por terra um argumento que se tem colocado como o mais forte dos anteriores.

Se a segurança rodoviária só aumenta com um mundo cheio de VA vamos restringir a condução a apenas veículos autónomos e impedir o direito de escolha pessoal?

Transformar o centro de Lisboa?

Os veículos autónomos prometem revigorar o centro das cidades. Locais que até agora vivem com o congestionamento e barulho dos automóveis podem vir a ser transformados em zonas verdes, passeios largos e espaços únicos para se sentar e usufruir. Mas como?

Imaginem uma visita à Baixa, entrar no automóvel e conduzir rumo ao restaurante que está na berra. Além da confusão que é levar um carro para o centro da cidade, procurar um lugar de estacionamento pode ser um dos exercícios mais monótonos e cansativos na viagem. Um estudo inglês aponta que 30% do tráfego no centro das cidades, ou até 45% em alguns casos, é provocado por condutores à procura de um lugar de estacionamento34.

Um VA, devido à sua capacidade de se conectar à infraestrutura de estacionamento (V2I) e aos outros veículos (V2V), consegue ter acesso um conjunto de informações que lhe permitem saber aonde se deve dirigir. A eficiência da procura bem como das rotas, evitando congestionamento rodoviário em certos acessos, permite encurtar o tempo de viagem. Esta redução beneficia a eficiência energética e a qualidade do ar.

Mas porque é que o VA necessita de ser estacionado no centro da cidade? Não poderá o veículo largar os passageiros no ponto de destino e afastar-se do local, uma vez que é autónomo? A pressão de estacionamento no centro das cidade é elevada porque a oferta é escassa, o que se reflete nos preços absurdos de estacionamento. O VA pode estacionar fora do centro beneficiando de taxas de estacionamento mais baixas ou mesmo em casa, onde o estacionamento é gratuito.

Desta forma, o espaço actualmente destinado a estacionar os carros poderá ser convertido em locais de lazer. Esperamos do futuro uma Lisboa mais verde, com espaço para passear, andar de bicicleta ou até brincar na rua como antigamente?