Transformar o centro de Lisboa?

Os veículos autónomos prometem revigorar o centro das cidades. Locais que até agora vivem com o congestionamento e barulho dos automóveis podem vir a ser transformados em zonas verdes, passeios largos e espaços únicos para se sentar e usufruir. Mas como?

Imaginem uma visita à Baixa, entrar no automóvel e conduzir rumo ao restaurante que está na berra. Além da confusão que é levar um carro para o centro da cidade, procurar um lugar de estacionamento pode ser um dos exercícios mais monótonos e cansativos na viagem. Um estudo inglês aponta que 30% do tráfego no centro das cidades, ou até 45% em alguns casos, é provocado por condutores à procura de um lugar de estacionamento34.

Um VA, devido à sua capacidade de se conectar à infraestrutura de estacionamento (V2I) e aos outros veículos (V2V), consegue ter acesso um conjunto de informações que lhe permitem saber aonde se deve dirigir. A eficiência da procura bem como das rotas, evitando congestionamento rodoviário em certos acessos, permite encurtar o tempo de viagem. Esta redução beneficia a eficiência energética e a qualidade do ar.

Mas porque é que o VA necessita de ser estacionado no centro da cidade? Não poderá o veículo largar os passageiros no ponto de destino e afastar-se do local, uma vez que é autónomo? A pressão de estacionamento no centro das cidade é elevada porque a oferta é escassa, o que se reflete nos preços absurdos de estacionamento. O VA pode estacionar fora do centro beneficiando de taxas de estacionamento mais baixas ou mesmo em casa, onde o estacionamento é gratuito.

Desta forma, o espaço actualmente destinado a estacionar os carros poderá ser convertido em locais de lazer. Esperamos do futuro uma Lisboa mais verde, com espaço para passear, andar de bicicleta ou até brincar na rua como antigamente?

E assim começou…

A substituição da condução humana de veículos por um sistema computacional e ferramentas adequadas que permitam a condução autónoma não é uma ideia deste século. Um pequeno contexto histórico permite perceber o caminha já trilhado.

O evento pioneiro dos VA teve lugar em 1939. O VA foi apresentado na Feira Mundial de Nova Iorque (EUA) como a projecção de um sonho. Norman Geddes, patrocinado pela General Motors, colocava o VA como aquilo que o mundo teria para oferecer 20 anos mais tarde (em 1960)28. Mas, nos anos que se seguiram, os esforços de desenvolvimento dos grandes fabricantes de automóveis foram direccionados para a guerra.

Só em 1977, a Universidade de Tsukuba, no Japão, construiu aquele que pode ser considerado o primeiro veículo robótico inteligente29. Com câmaras e uma unidade de processamento a bordo permitia detetar obstáculos e seguir linhas.

Em 1983, a Universidade de Carnegie Mellon (EUA) desenvolveu um modelo, o Terregator30, que usava a combinação de lasers, radares e câmaras para se movimentar sem intervenção humana. Três anos mais tarde, o NavLab 131, também produzido por esta universidade, seria o 1º VA a levar pessoas a bordo a uma velocidade máxima de 32 km/h.

Na mesma década (1980), na Europa, a equipa da Universidade de Bundeswehr München, Alemanha, desenvolveu vários projectos na área da condução autónoma. Por fim, em 1994, apresentaram um Mercedes-Benz Classe-S modificado chamado de VaMP, que se deslocou de modo autónomo por mais de 1000 km, com velocidades de até 130 km/h28.

O projeto ARGO32, desenvolvido entre 1997 e 2001, pela Universidade de Parma, Itália, permitiu construir um protótipo de veículo (com algoritmos de interpretação de imagem) que, seguindo marcas pintadas numa estrada  conduziu, sensivelmente, 2000 km em seis dias, com velocidade média de 90 km/h e 94% do tempo em modo autónomo29.

Já em 2004, a DARPA, agência americana da defesa, promoveu um concurso para acelerar o desenvolvimento dos veículos autónomos. Os participantes deviam apresentar um VA que conseguisse terminar o desafio criado pela DARPA. Nesse ano, nenhum participante terminou. No ano seguinte, participaram 195 equipas; a Universidade de Stanford ganhou e 5 equipas terminaram o desafio: mais de 200 km no Nevada conduzidos sem condutor humano33. Este foi o ponto de viragem.

O sonho vem de trás, mas o esforço duplicou nos últimos anos e o investimento em I&D neste tema já não tem fronteiras nem limites. A indústria automóvel tem sido pressionada por outros sectores no sentido de desenvolver a tecnologia para se manter firme no mercado, nomeadamente, empresas de informática, sistemas de informação ou inteligência artificial que vão formando alianças para se afirmarem como o melhor player no mercado.