2. Abordagem Experimental

Em proteómica quantitativa, uma das técnicas base mais utilizadas para a separação de proteínas é a electroforese 2-D. Em comparação com a electroforese a uma dimensão em géis desnaturantes de poliacrilamida, conhecida por SDS-PAGE (sodium dodecyl sulfate-polyacrylamide gel electrophoresis.




Fig. 2 - Separação de proteínas em géis de poliacrilamida. À esquerda, separação por SDS-PAGE de extractos proteicos de células de Pseudomonas putida KT2440 obtidas em diferentes meios de crescimento. À direita, separação por electroforese 2-D do extracto proteico correspondente à 5ª coluna do gel da esquerda.

Em electroforese 2-D, as proteínas são separadas com base em duas das suas propriedades: numa primeira dimensão, de acordo com o seu ponto isoeléctrico (pI) e, numa segunda dimensão, em gel de SDS-PAGE, de acordo com o seu peso molecular (MW). Ou seja, a electroforese 2-D resulta da combinação de duas técnicas: a focagem isoeléctrica (IEF), seguida de uma separação por SDS-PAGE. Quando bem sucedida, obtem-se um gel de poliacrilamida contendo numerosos spots, bem separados, cada um correspondendo a uma proteína (ou a uma forma proteica), como ilustrado na Figura 2. Os fundamentos desta abordagem foram apresentados, pela primeira vez, por O’Farrell e Klose em 1975 (O´Farrell, 1975; Klose, 1975). Desde então, têm-se verificado melhoramentos substanciais na qualidade e reprodutibilidade dos resultados obtidos, em consequência do desenvolvimento de equipamentos e reagentes específicos. Hoje em dia, a aplicação da electroforese 2-D permite uma alta resolução das várias espécies proteicas presentes numa amostra biológica, de uma forma reprodutível.

Para além da sua alta resolução e reprodutibilidade, a electroforese 2-D permite também separar as várias formas proteicas que tenham sofrido modificações pós-tradução. A separação destas formas é possível visto que essas modificações conferem propriedades diferentes à proteína, em particular, um diferente pI ou peso molecular. Por exemplo, consegue-se distinguir as formas fosforilada e não-fosforilada das fosfo-proteínas porque este tipo de modificação pós-tradução implica uma alteração do seu pI e MW. Pode-se avaliar a presença de proteínas fosforiladas num proteoma dividindo a amostra proteica em duas alíquotas, tratando-se uma delas com uma fosfatase, para remoção dos grupos fosfato. Por comparação dos mapas obtidos após separação por electroforese bi-dimensional das amostras tratada e não tratada é possível identificar as proteínas que se encontram fosforiladas, uma vez que a perda do grupo fosfato resulta na sua migração para zonas mais básicas do gel, durante a focagem isoeléctrica (Yamagata et al., 2002). Modificações do tipo acetilação, glicosilação ou hidrólise específica de determinados péptidos, alteram o peso molecular da proteína modificada e, eventualmente, o seu pI, tornando assim possível a detecção dessas formas com base nos géis 2-D.

Em estudos de proteómica quantitativa, a análise comparativa dos proteomas obtidos em duas (ou mais) situações em estudo, tem por objectivo identificar e quantificar as possíveis alterações ao nível da abundância relativa de cada espécie proteica separada nos géis 2-D. Desta forma, torna-se possível identificar as proteínas envolvidas na resposta celular à alteração imposta. Geralmente, é construído um mapa de referência do proteoma de células cultivadas na condição de referência. Este mapa é construído através da catalogação das várias espécies proteicas separadas em géis 2-D, após a sua identificação.

Embora existam já mapas disponíveis para os proteomas de um número significativo de organismos (Hoogland et al., 2000; Babnigg e Giometti, 2004), entre os quais S. cerevisiae (Boucherie et al., 1995; Schevchenko et al., 1996), as particularidades da técnica utilizada em cada laboratório podem dificultar o recurso aos mapas de referência disponíveis, além de que estes podem não incluir as proteínas que, num determinado estudo, interessa analisar. Torna-se, assim, frequentemente necessária a construção de um mapa, baseado nas condições experimentais escolhidas para a execução das experiências de 2-D, que possa, posteriormente, servir de base de análise para todos os trabalhos sobre o mesmo sistema biológico em que o protocolo de electroforese 2-D aplicado seja semelhante. No entanto, tendo em consideração os custos inerentes à identificação exaustiva de todas as proteínas separadas por electroforese 2-D, muitas vezes opta-se só pela identificação das proteínas cuja abundância varia no caso particular em análise.

Em termos experimentais, a análise global por proteómica quantitativa, utilizando a electroforese 2-D como técnica de separação, envolve várias fases, seguindo o esquema da Figura 3:

i. Preparação da amostra

ii. Focagem isoeléctrica (1ª dimensão)

iii. SDS-PAGE (2ª dimensão)

iv. Detecção e quantificação das proteínas

v. Identificação das proteínas

 



Fig. 3 - Representação esquemática dos vários passos da abordagem proteómica quantitativa usada no Grupo de Ciências Biológicas do IST.