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ARTIGO DE DIVULGAÇÃO - YOUTUBE

Guilherme Portela 82525, Margarida Simões 84611

Instituto Superior Técnico - Taguspark

Edifício Núcleo Central, 100, 2740-122 Porto Salvo, Portugal

E-mail: guilherme0portela@gmail.com, margarida.simoes@tecnico.ulisboa.pt

Resumo

Com a elaboração deste artigo pretende-se ganhar conhecimento de como uma das grandes empresas na área das comunicações multimédia opera, bem como desenvolver espírito critico no filtro e recolha de informação relevante durante a pesquisa. Além dos aspectos mais técnicos, como a transmissão e codificação de vídeo, pretende-se ter contacto com o modelo de negócio, e com as preocupações sociais e legais que uma empresa com o alcance do Youtube tem de ter. Uma das dificuldades sentidas durante a pesquisa foi a falta de informação divulgada pelo YouTube/Google. No entanto, após a escrita do artigo, ficou-se com uma noção mais profunda e clara do modo de operar do Youtube, com ênfase nas tecnologias usadas, logísticas de negócio e tratamento do conteúdo.

Index Terms — Youtube, Google, multimédia, vídeo, stream, machine learning, codificação, rendimento, copyright, publicidade, moderação.

Introdução

No âmbito da cadeira de Comunicações e Multimédia, desenvolveu-se este artigo dada a importância da multimédia no dia-a-dia e da relevância que é, para nós engenheiros, percebermos os mecanismos que estão por trás da criação e processamento de imagens, vídeos e áudio. Este artigo tem como tema o YouTube, que através da interactividade que os utilizadores têm entre eles e com a plataforma, conseguiu crescer e tornar-se na maior empresa de partilha de vídeos do mundo. Além da sua escala e complexidade nas tecnologias usadas como codecs e protocolos, aposta muito no seu modelo de negócio e tem de ter em consideração o impacto social e os aspectos legais que a criação e consumo de conteúdo têm associados.

Indica-se de seguida a estrutura do artigo. Na secção 2 e 3, apresenta-se uma breve história do Youtube e expõe-se de uma maneira simplificada a arquitectura e Infrastrutura do sistema respectivamente. Na secção 4, aborda-se as tecnologias usadas na transmissão de vídeo, os codecs e o algoritmo de procura do Youtube. De seguida, faz-se referência aos mecanismos de upload. Na secção 6, explora-se os modelos de negócio, referindo o YouTube como parte da Google e modelos de rendimento. Nas secções 7 e 8, fala-se nos direitos de autor e no impacto social que certo tipo de conteúdo pode ter, bem como técnicas de moderação do mesmo. Finalmente, na secção 9 indica-se a relevância que a língua portuguesa tem, e na secção 10 o crescimento e as previsões para o futuro do YouTube.

Breve História do YouTube

O Youtube é o maior site de partilha de vídeos do mundo com sede em São Bruno, California. Foi fundado por Chad Hurley, Steven Chen e Jawed Karim, ex-colegas na Paypal, a 14 de Fevereiro de 2005, em San Mateo, California. O principal conceito da empresa foi criar uma plataforma de partilha de vídeos que permitisse aos utilizadores o upload, partilha e visualização dos mesmos[1].

Após alguns meses de desenvolvimento das funcionalidades do site, a 23 de Abril de 2005, foi feito o primeiro upload de um vídeo intitulado de Me at the Zoo que mostra o co-fundador Jawed Karim no zoológico de San Diego. A Novembro de 2005, o Youtube recebeu o seu primeiro investimento, no valor de 3.5 milhões pela empresa Sequoia Capital. Desde aí, houve um crescimento constante, que se tornou notável em Julho de 2006, com o upload de mais de 65 000 vídeos por dia e um número médio de visualizações diárias de 100 milhões[2].

A 9 de Outubro de 2006, a Google anunciou a compra do YouTube por 1.65 biliões de dólares em acções, compra que foi finalizada a 13 de Novembro do mesmo ano[3]. Em 2014, Susan Wojcicki, anteriormente envolvida na fundação da Google e na aquisição do YouTube, torna-se CEO do YouTube.

Ao longo dos anos o YouTube foi evoluindo, incluindo cada vez mais funcionalidades e serviços para os utilizadores. O seu uso massificou-se e em Agosto de 2018, foi classificado pela Alexa Internet como o segundo site mais popular do mundo[4]

Infraestrutura e Arquitectura

Apesar dos modelos e sistemas do Youtube/Google serem proprietários, é possível ter uma compreensão básica de como estes funcionam.

O que acontece desde o momento em que um vídeo é carregado para a plataforma até este poder ser visualizado por outros utilizadores?

A Figura 1, ilustra de forma simplificada este processo. Quando um utilizador cria um vídeo e carrega-o para a plataforma, este é enviado para os servidores do YouTube, onde é posteriormente processado, ou seja, são criadas diferentes versões do vídeo, com diferentes formatos de ficheiro e resoluções que são guardadas em diferentes data centres da Google.

O Youtube distribui os vídeos, a partir de diferentes CDNs (content distribution network), nomeadamente CDNs de terceiros e a CDN da Google (Google Cloud CDN) ou directamente dos data centres. As CDNs têm instalados em diferentes localizações conjuntos de servidores, que armazenam o conteúdo em cache, de modo a que o web request do utilizador seja processado pelos servidores geograficamente mais próximos, reduzindo assim o tempo de latência.

Geralmente o conteúdo mais acedido e popular é guardado numa CDN e o conteúdo que não é tão requisitado, por exemplo vídeos que recebem dezenas de visualizações por dia, é acedido através dos servidores nos data centres. O Youtube usa bases de dados para guardar a metadata dos vídeos como os nomes dos users, passwords, títulos e descrições dos vídeos. Quando um utilizador faz um web request, os servidores seleccionam o melhor formato de ficheiro tendo em conta o browser do utilizador, e iniciam o stream do vídeo[5].

Figura 1: Arquitectura simplificada do Youtube: Upload, storage e playback.

Tecnologia

Qualidade de video

Um dos principais objectivos do YouTube é maximizar a qualidade de video que cada utilizador recebe, tendo em conta a limitação da sua largura de banda. Para isso é usado Adaptive Streaming.

Para cada vídeo, são guardadas múltiplas versões, cada uma com uma dada resolução, em que as resoluções mais altas apresentam um maior bit rate e dentro da mesma resolução, um maior bit rate leva a uma melhor qualidade de vídeo. O YouTube suporta as seguintes resoluções: 144p,240p, 360p, 480p, 720p (HD), 1080p (HD), 1440p(HD) ,4k e 8K. O número de bits usados para codificar cada resolução é decidido pelo YouTube e pelas limitações do codificador usado[6].

Durante o stream de um vídeo, são enviados para o utilizador segmentos desse vídeo, codificados com um dado bitrate (associado a uma resolução), que melhor se ajusta ao seu tamanho de ecrã e web browser, como se ilustra na Figura 2. Este protocolo adapa-se ás condições de rede, dado que enquanto o conteúdo está a ser reproduzido no utilizador, este selecciona o próximo segmento com o maior bit rate possível consoante as condições e limitações da rede naquele momento. Isto permite uma adaptação em tempo real, com visualização do conteúdo a uma maior qualidade e com menos paragens[6].

Figura 2: Representação de Adaptive Streaming [6].

Principais codecs no stream de vídeo

Os principais codecs usados pelo YouTube para stream de vídeo são o VP9 e o H.264/MPEG-4 AVC em conjunto com os codecs de áudio stereo Opus (ficheiro WebM) e AAC (ficheiro MP4), respectivamente. O mais recente codec, neste momento ainda em testes, é o AV1, que promete melhor qualidade em streams de HD, com mais eficiência na compressão de vídeo.

O H.264/MPEG-4 AVC- Advanced Video Coding, formato de compressão de vídeo largamente usado para streaming de vídeos, foi desenvolvido pelo ITU-T Video Coding Experts Groups (VCEG) em parceria com a MPEG. É block-oriented com motion-compensation, optimizando assim a compressão de vídeo. Distingue-se pela sua resiliência a erros, em redes de Internet móveis e fixas, e pela flexibilidade do codec na relação eficiência-complexidade da compressão.

O VP9 é um formato de codificação de vídeos desenvolvido pela Google. Uma melhoria que o VP9 trouxe, em relação ao H.264, foi a optimização do bit rate utilizado para a mesma qualidade, principalmente para vídeos com maior resolução (HD e 4k). Distingue-se dos outros codificadores por dar mais importância às formas/traços da imagem mais bem definidos e usar transformadas assimétricas que ajudam a evitar o block-effect e delinear melhor os traços da imagem em cenas com muito movimento. Isto permitiu aos utilizadores conseguir ver vídeos com mais resolução usando a mesma largura de banda[7].

O Opus, é um formato de codificação para áudio, com perdas, que pode ser usado para voz, áudio em geral, aplicações em tempo real e streams, com a propriedade de conseguir ajustar dinamicamente o bit rate, tamanho das frames e ter um tempo de latência reduzido. Tem algumas vantagens em relação ao ACC, tais como: ser um codec aberto e consegue atingir qualidades de áudio superiores para os mesmos bit rates, com tempos de latência muito baixos.

AV1 é um codec de compressão de vídeo aberto e interoperável, desenvolvido pela Alliance for Open Media, que melhora a compressão de vídeo em cerca de 30 %, quando comparado ao VP9 ou HEVC, em troca de um pequeno aumento na complexidade. Apresenta qualidade muito alta para vídeos em real-time, incluindo features como 4k UHD e HDR[8].

Vai permitir aos utilizadores ter uma melhor experiência ao ver streams em HD e gastar menos bit rate(dados), o que é bastante benéfico, dado que mais de 50% das visualizações vêm de dispositivos móveis.

Foi desenvolvido para diferentes tipos de aplicações como streaming, aplicações em tempo real e videoconferências. Este codec, suportado pelo Chrome 70 e FireFox 63, já está a ser testado pelo YouTube, com o intuito de ser lançado em breve. Foi publicada uma playlist com variados tipos de vídeos codificados com AV1 que se pode encontrar no seguinte link [9].

Algoritmo de procura do YouTube

Foi necessário desenvolver um algoritmo que conseguisse encontrar para cada utilizador os vídeos mais prováveis de este ver e gostar. O algoritmo, é no fundo um loop, recomenda vídeos ao utilizador com base no que ele procura e nos seus interesses, e com o seu feedback, faz ajustes, de maneira a optimizar o conteúdo dado.

Os três maiores desafios no algoritmo de recomendação de vídeos são: a grande quantidade de conteúdo existente, lidar com o conteúdo mais antigo e mais recente (centenas de horas de vídeo são carregadas a cada minuto), e por fim conseguir interpretar com clareza a satisfação de cada utilizador em relação aos vídeos vistos no passado[10].

O algoritmo de recomendação do YouTube usa rede neuronais profundas. Pode-se dividir este sistema em duas fases: uma rede gera recomendações e outra rede classifica esses vídeos gerados, como está representado na Figura 3. A primeira, gera centenas de vídeos candidatos para o utilizador baseando-se nos vídeos que viu recentemente, no seu histórico de pesquisa e no seu histórico de actividade. De seguida, a rede de classificação, classifica cada um dos vídeos candidatos, podendo ter como métricas o interesse que utilizadores com gostos semelhantes viram e gostaram[10].

Figura 3: Arquitectura do sistema de recomendação[10].

O algoritmo está em constante mudança, sempre com o objectivo de dar aos seus utilizadores conteúdo personalizado, do seu interesse e que o mantenha na plataforma o maior tempo possível. São feitos com regularidade, testes a grupos de milhões de users, com o intuito de detectar que mudanças ao algoritmo poderão ser positivas ou negativas, e como essas mudanças afectam a experiência de diferentes tipos de utilizadores.

Há seis secções na plataforma em que o algoritmo actua, tendo cada uma destas secções o seu próprio conjunto de sistemas e algoritmos, para que haja uma optimização dos resultados que se quer alcançar. Podemos dividi-las em: resultados de pesquisa, vídeos recomendados (“watch next”), página inicial, tendências, subscrições e notificações. Abaixo, descreve-se sucintamente a ideia geral dos algoritmos das secções de pesquisa e recomendações[11].

Na pesquisa, dada a query do utilizador, o algoritmo encontra os vídeos que fazem match com essa query, analisando o título, descrição e keywords dos vídeos, bem como o conteúdo que pessoas que fizeram a mesma query visualizaram. Os resultados do topo, são os que fazem match com a query e que adicionalmente são mais positivos em relação ao feedback que os utilizadores deram desses vídeos (maior número de likes, comentários, tempo de visualização).

As sugestões/recomendações é uma das áreas em que o YouTube aposta bastante, pois uma grande parte do tempo que os utilizadores passam na plataforma deve-se a uma espécie de imersão numa corrente de vídeos sugeridos, altamente personalizados e viciantes. O algoritmo tenta encontrar o que o utilizador quer ver a seguir, baseando-se no conteúdo que ele está a ver no momento, juntamente com o seu histórico de visualizações e respectivo feedback. Alguns exemplos de possíveis recomendações são: vídeos do mesmo canal, vídeos que outros utilizadores, que também viram o vídeo que se está a ver, viram e conteúdo semelhante, mas personalizado para o utilizador em questão.

Mecanismos de Upload

Um dos desafios do YouTube foi a heterogeneidade de ficheiros que os utilizadores carregavam, sendo necessário descodificar uma grande variedade de ficheiros e lidar com inúmeros codecs. As definições de codificação recomendadas para o upload de vídeos são: ficheiro MP4, codec de áudio AAC e de vídeo H.264 [12]. No entanto muitas mais codificações são aceites como: MOV, MPEG, AVI, WMV, HEVC (H.265) [13]. Todos os formatos de vídeo no YouTube usam progressive scanning, no entanto é possível fazer o upload de vídeos com progressive-scanning ou interlaced scanning. O tamanho máximo que cada ficheiro pode ter é o mínimo entre 128 GB e 12 horas. Actualmente, podem ser carregados na plataforma vídeos 3D, vídeos 360 e vídeos de realidade virtual.

Existem três definições de privacidade possíveis quando se faz o upload: o vídeo pode se público, privado ou não listado. Os vídeos públicos estão visíveis para toda a gente e aparecem nos resultados de pesquisa. Já os vídeos privados apenas podem ser vistos por quem fez o upload e não aparecem nos resultados de pesquisa. Os vídeos não listados, não aparecem no YouTube nem nos resultados de pesquisa, mas podem ser acedidos por qualquer pessoa que tenha o link.

Todo o conteúdo que é colocado na plataforma, está sujeito a uma verificação das guidelines seguidas pelo YouTube. O não cumprimento das mesmas, pode levar a restrições ou eliminação do conteúdo. Não é permitido nudez ou conteúdo sexual explícito, vídeos que contenham conteúdo violento ou que incentivem violência contra pessoas de diferente etnia e orientação sexual. Também não é permitido assediar, ou partilhar informações pessoais de terceiros. É importante respeitar os direitos de autor, e carregar apenas conteúdo para o qual se tem direito.

Modelo de Negócios

O modelo de negócios do YouTube pode ser esquematizado da seguinte forma, com base na interpretação de Dennis Oakley[14]:

  • Clientes-alvo: mercado em massa online e empresas de marketing (ou empresas que procurem publicitar-se).
  • Canais de suporte: website (youtube.com), aplicação móvel e vídeos embebidos noutros websites ou links.
  • Interacção com os clientes: a plataforma providenciada pelo YouTube é self-service.
  • Recursos importantes: algoritmos de procura e indexação de informação desenvolvidos ao longo do tempo, e a base de utilizadores.
  • Parceiros de negócio: empresas de media (detentores de direitos de autor) e Content Creators (utilizadores geradores de conteúdo sob a forma de vídeos e posts na plataforma).
  • Actividades: garantir a retenção da audiência e a optimização das ferramentas de publicidade.
  • Estrutura de custo: manutenção de data centres (para armazenamento de informação em massa) e desenvolvimento da plataforma.
  • Fonte de rendimentos: publicidade (via marketing e consequentemente Content Creators), taxas de direitos de autor partilhados com as empresas de media sobre conteúdo protegido e ainda serviços premium (à base de subscrições).
  • Valores propostos pelo YouTube: “Give everyone a voice”, “Let everyone see the world”[15]. O YouTube procura respeitar a liberdade de expressão dos seus utilizadores.

YouTube como parte da Google

Dada a quantidade de uploads diários feitos para o website, não é de todo viável apoiar um método de codificação a nível de browser para playback sujeito a pagar direitos de autor. Logo, a Google focou-se em investir no melhoramento das alternativas sem custo: o formato VP9 e mais recentemente o formato AV1. Estes formatos têm como objectivo serem universais e de livre acesso. Acerca do formato AV1 em particular, este não só é livre em termos de custo como também é mais eficiente em termos de compressão de data do que o formato H.264/MPEG-4 AVC[16], o standard de compressão de vídeo mais recente (cuja utilização é regulada pelos detentores dos direitos de autor: MPEG LA, HEVC Advance, Technicolor, and Velos Media).

A Google raramente lança estimativas para os custos de manutenção e funcionamento do YouTube. Contudo, as estimativas apontavam para aproximadamente $2.000.000 mensalmente antes de o YouTube ser adquirido pela Google, e aproximadamente $666.000 após a dita compra. Esta redução deveu-se ao facto da Google diminuir em parte os custos de bandwidth (ao ter a sua própria rede de fibra óptica e data centres) e controlar a sua própria plataforma de publicidade (o que implica que deixou de existir um intermediário entre o YouTube e as empresas de publicidade e marketing)[17].

De forma a tornar o YouTube rentável, a Google implementou publicidade em formato de vídeo, geralmente exibido antes do vídeo pretendido (pre-roll ads) e em banners em overlay (durante o vídeo pretendido), dada a sua centralidade com campo de visão do utilizador. Com o uso cada vez mais frequente do YouTube (aproximadamente 40 minutos diários em Junho de 2018 [18]), os rendimentos através de publicidade aumentaram substancialmente, impulsionados pelos baixos preços de acessibilidade ao mercado de marketing promovidos pela Google.

As estimativas para os rendimentos provenientes do YouTube, em particular relacionados com o programa de publicidade implementado, apontam para um crescimento muito significante de $3.700.000.000 em 2012 pouco tempo depois de ser adquirido pela Google[19] para $15.000.000.000 em 2018[20]. Contudo, é notável que grande parte destes rendimentos acabam por pertencer às entidades detentoras de direitos de autor sobre o conteúdo, como é possível notar pela figura 4.

Figura 4: Rendimentos (respectivamente brutos e líquidos) de publicidade entre 2011 e 2013[21].

Os rendimentos gerados através do YouTube Partner Program, baseado no AdSense, são repartidos com os criadores de conteúdo independentes de forma a compensá-los pela qualidade e tracção do conteúdo que produzem.

Novos modelos de rendimento

Ao longo do tempo, foram abertos serviços em paralelo dedicados a demográficas particulares do mercado. Estes serviços foram inicialmente protagonizados pelo YouTube Premium (conhecido também por YouTube Red), que retirava toda a publicidade da interface de utilizador, disponibilizava um método de download de vídeos e permitia acesso exclusivo a determinados canais ou e séries originais na plataforma. Foi também adicionada ao YouTube Red a capacidade de manter o vídeo em playback após o bloqueio de ecrã no caso de dispositivos móveis, de forma a incentivar a funcionalidade de Music Streaming na plataforma.

Faceta Legal

Para enquadrar este tópico, é necessário compreender as implicações legais que os direitos de autor (copyright), ou seja os direitos patrimoniais, têm para a plataforma do YouTube. Estes direitos patrimoniais são o que permite ser exercida exploração económica da obra intelectual. Segundo a página de ajuda da Google, relevante também à plataforma YouTube, qualquer tipo de obra original realizada por um individuo baseada num meio físico (áudio, vídeo, imagem, etc.) é acrescida por copyright pertencente a esse indivíduo[22]. Como uma plataforma cujo conteúdo é gerado quase na totalidade pelos seus utilizadores, é necessário criar um sistema robusto de protecção de direitos de autor, dada capacidade de monetização de conteúdo existente. Quando um vídeo é uploaded para o YouTube, há que garantir que não infringe copyrights. Dado que inspecção manual nesta escala seria impossível, foi desenvolvido um sistema automatizado. O Content ID é uma ferramenta de gestão de conteúdos criada para o propósito de auxiliar na identificação de conteúdos sujeitos a copyright na plataforma, que funciona da seguinte forma[23]:

  1. Um criador de conteúdo pode submeter ficheiros de referência (áudio, vídeo) a partir dos quais o sistema de Content ID cria uma “fingerprint”.
  2. A ferramenta posteriormente selecciona vídeos que apresentem uma “fingerprint” que inclua aquela criada pelos ficheiros de referência.
  3. O criador de conteúdo tem três opções quando ocorre uma correspondência: pode bloquear o playback desse vídeo por completo; pode monetizar o vídeo a seu favor; ou pode escolher não tomar acção directa, mantendo a oportunidade de observar as análises estatísticas produzidas pelo YouTube acerca do vídeo em questão.

A maior parte dos criadores de conteúdo escolhem a segunda opção. Os criadores dos vídeos seleccionados pelo sistema de Content ID têm do seu lado a opção de contestar a decisão do sistema, dado que existem inúmeros falsos positivos[24][25]. Um criador de conteúdo pode utilizar conteúdo copyrighted na sua obra se obtiver autorização do dono dos direitos de autor original ou se esta considerar o Fair Use Act. O conceito de Fair Use varia de país para país, mas no geral permite a utilização de conteúdo com copyrights sem autorização prévia do dono deste se for para fins de ensino, reportagem, comentário, crítica, pesquisa e sátira[26]. Para criadores de conteúdo que querem permitir a geral utilização livre do seu conteúdo, podem associar-lhe uma licença de Creative Commons[27], mantendo os seus direitos de autor[28].

Impacto Social

A súbita explosão de popularidade do YouTube levou a uma revolução na fácil criação e distribuição de vídeos pela Internet, permitindo um maior grau de inovação, expressão individual, e aprendizagem na comunidade online. Também trouxe relevância a nível da sensibilização para questões sociais como (cyber)bullying e igualdade de géneros.

Audiências-alvo

Devido à natureza da plataforma e ao mecanismo de recomendação de vídeos, os criadores de conteúdo mais carismáticos acabam por agregar muitos subscritores. Contudo, a popularidade pode ser utilizada conscientemente ou não para influenciar os visualizadores. Certos criadores de conteúdo conseguem tornar-se porta-vozes da opinião pública ou vectores de publicidade com base no conteúdo que produzem e na demográfica a que apelam. As categorias de vídeos que geram mais tracção são entre outras, product reviews, vlogs, e comedy[29].

O mecanismo de recomendação de vídeos dá mais visibilidade àqueles com mais tracção em termos de visualizações num menor espaço de tempo (vídeos virais), que cria um efeito bola-de-neve. É benéfico para o YouTube pois traz um rendimento mais alto devido ao alcance da publicidade. Contudo, estes vídeos podem conter conteúdo malicioso, ou incitante à violência, ou ao extremismo. A restrição de idade em certos vídeos imposta como mecanismo de protecção do YouTube é falível dado que não é verificável, o que leva à exposição de menores a ideais ou actividades potencialmente perigosas. Na figura 5 está identificado um questionário feito a cidadãos dos E.U.A. em Junho de 2018 que mostra que a comunidade do YouTube se encontra exposta a este tipo de vídeos com regularidade notável.

Figura 5: Frequência de encontros de vídeos falsos, perigosos e maliciosos por utilizadores dos E.U.A., Junho de 2018 [30].

Moderação de conteúdo

Os esforços de moderação na plataforma passam por mantê-la livre de conteúdo que desrespeite as YouTube Guidelines ou que seja malicioso para o utilizador comum. Estes esforços levaram à implementação do sistema de flagging, que é em grande parte automatizado. Como é possível ver pela figura 6, a principal razão pela qual vídeos e respectivos canais são removidos está relacionada com conteúdo enganoso, malicioso ou spam, ou seja, conteúdo existente que foi re-uploaded por outro utilizador, vídeos enganadores ou com conteúdo substancialmente diferente da sua metadata (título, descrição, thumbnail). Outras razões relevantes incluem nudez ou conteúdo sexual, segurança de menores, e incitação à violência e ao extremismo.

Apesar de existir um número considerável de flags por individuos, o principal contribuidor são as máquinas. A figura 7 torna evidente que maioria do conteúdo flagged é identificado automaticamente pelos diversos sistemas mencionados anteriormente (como o Content ID, por exemplo)[32][33].

Figura 6: Avaliação das razões de remoção de vídeos mais comuns, entre Janeiro e Março de 2019[31].

Figura 7: Comparação em quantidade de vídeos “flagged” por diferentes entidades, entre Janeiro e Março de 2019[31].

Caso um vídeo respeite as YouTube Guidelines e não esteja a infringir nenhuma regra relacionada com direitos de autor, pode ainda conter ideias controversas. A plataforma pode ainda tomar acções deliberadas sobre pontos de vista que não apoia. Um exemplo recente desta situação é a decisão por parte do YouTube de retirar a monetização de vídeos a favor do movimento anti-vacínas (anti-vax) nos Estados Unidos da America[34]. Levanta-se a questão de se neste aspecto deve ser protegido o direito à utilização da plataforma para manifestação de opiniões pessoais à guarda da liberdade de expressão. Nesta situação deve-se considerar que o YouTube mantém o direito de remover vídeos que considera prejudiciais à plataforma e está disposto a colaborar com as autoridades caso seja necessário. Existe também uma linha que separa o que é considerado como debate de o que é considerado um ataque aos ideais de alguma religião, a uma instituição, ou até a um grupo étnico (designado como hate speech). Essa linha é a incitação à violência em direcção ao tópico do conteúdo[35]. Conteúdo extremista é consistentemente removido da plataforma devido à sua capacidade de influência sobre aqueles que se sentem ostracizados ou revoltados com a sociedade onde se encontram e procuram um escape, muitas vezes com recurso à violência.

Nem toda a moderação é feita pela plataforma. O conteúdo disponível no YouTube contém todo o tipo de opiniões e pontos de vista de quase todo o espectro político. Estados como a República Popular da China e a Coreia do Norte (regimes respectivamente monopartidário e ditatorial) bloquearam completamente o acesso ao YouTube de forma a manterem o controlo sobre o conteúdo a que a população deles é exposto. Esta forma de censura é imposta para evitar instabilidade a nível de dissidência política, e no caso das ditaduras manter um determinado grau de ignorância acerca do mundo exterior e bloquear influências externas. A censura é no fundo um método de controlar pessoas e a informação em circulação, e o YouTube é visto como uma ameaça aos estados que a praticam.

Sobre Portugal

Portugal tem um papel relativamente pequeno no desenvolvimento e interacção com a comunidade mundial presente no YouTube. O mesmo não é verdade para a língua portuguesa. Sendo a sexta língua mais falada do mundo, a sua presença é notada, em particular pela grande comunidade brasileira online e até certo ponto a portuguesa. Apesar de inglês ser a língua franca do YouTube, existe um esforço evidente para a difusão de dobragens e legendas, em português brasileiro entre outras, de vídeos de outros canais e autores. O número de falantes de uma língua acaba por ter um impacto substancial na forma como o conteúdo é produzido. Dado que mais de metade da comunidade não fala inglês nativamente[36] deve-se ter em conta que alguns dos vídeos mais populares acabam por estar disponíveis na língua materna de quem os realizou. As legendas costumam ser feitas por visualizadores habituais de um canal que tenha conseguido alcançar uma comunidade representativa que não fale inglês nativo. A língua portuguesa acaba por ser uma presença substancial na comunidade do YouTube, sendo a língua-mãe de pelo menos 70 milhões dos seus utilizadores[37].

Sobre o Futuro

Serão abordadas nesta secção as principais ideias a retirar deste artigo. Juntamente com as conclusões depreendidas, poderemos gerar algumas previsões acerca do desenvolvimento futuro da plataforma.

Crescimento do YouTube

À medida que o mundo evolui em direcção a um acesso global à Internet por todas as faixas etárias, só se pode concluir que o crescimento da plataforma vai continuar no futuro próximo. Cada vez é mais importante para empresas ganhar visibilidade na web e a forma mais eficaz é publicidade. O Youtube tornou-se o vector de publicidade mais relevante dos dias de hoje. Contudo, para os criadores de conteúdo, tem vindo a tornar-se muito mais difícil ganhar tracção. Apesar de haver muitos mais criadores de conteúdo, os que já estão estabelecidos têm muita vantagem ao terem uma comunidade que se vê pouco inclinada a mudar os seus hábitos de visualização.

O YouTube é uma fonte excepcional de uma importante moeda de troca entre grandes empresas: informação de utilizadores. O Youtube mantém um grau de conhecimento dos seus utilizadores ao nível de preferências, retenção de atenção, e de perfil pessoal (faixa etária, género, etc.). Esta base de dados alimenta o principal negócio da Google, marketing e publicidade.

Previsões

Por fim, podemos assumir com alguma segurança que iremos ver um foco no apelo às massas cada vez mais presente. O Youtube será em breve um dos meios de comunicação com mais alcance e continuará a ser usado como o principal vector de crescimento da Google. Pode vir a ser usado regularmente para campanhas políticas ou humanitárias, enquanto já é uma via importante para o entretenimento, ensino e para a publicidade. A Google faz um esforço cada vez maior para apoiar codecs com direitos de autor sem custos Recentemente têm-se visto tendências para controlar cada vez mais o que é colocado na plataforma, como, por exemplo o Artigo 13 europeu, que por consequência de alterarem a legislação por trás da partilha de conteúdo online, podem ter um grande impacto na forma como os criadores de conteúdo gerem os seus canais e no planeamento da Google em relação ao desenvolvimento futuro do YouTube[38].

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio mútuo e os conselhos prestados pelo docente no planeamento da realização da componente vídeo e web do artigo de divulgação.

Referências

[1] YouTube (23 de Abril, 2005), link. Acedido em 10/05/2019.

[2] The New York Times (10 de Outubro, 2006) ,”Venture Firm Shares a YouTube Jackpot”, link. Acedido em 10/05 2019.

[3] The Telegraph (31 de Julho, 2008) link. Acedido em 10/05/2019.

[4] Youtube.com Traffic, Demographics and Competitors", link. Acedido em 10/05/2019.

[5] GoogleTalksArchieve , “Seattle Conference on Scalability”, link. Acedido em 11/05/2019.

[6] Engineering and Developers Blog (24 de Abril, 2018) , “Making high quality video efficient”, link. Acedido em 11/05/2019.

[7] Engineering and developers Blog (6 de Abril, 2015), “VP9: Faster, better, buffer-free YouTube videos”, link. Acedido em 11/05/2019.

[8] Alliance For Open Media, link. Acedido em 12/05/2019.

[9] YouTube Developers, “AV1 Beta Launch Playlist”, link. Acedido em 12/05/2019.

[10] Covington, P., Adams, J., Sargin, E. Deep Neural Networks for YouTube Recommendations, link Acedido em 12/05/2019.

[11] YouTube, “Algoritmo do YouTube: os funcionários do YouTube respondem suas perguntas (parte 1) “, link. Acedido em 12/05/2019.

[12] YouTube Help, “Recommended upload encoding settings”, link. Acedido em 15/05/2019.

[13] YouTube Help, “Supported YouTube file formats”, link. Acedido em 15/05/2019.

[14] Denis Oakley, “What is the YouTube business model?”, link. Acedido em 06/05/2019.

[15] https://www.youtube.com/yt/about/. Acedido em 06/05/2019.

[16] Google’s Royalty-Free Answer to HEVC: A Look at AV1 and the Future of Video Codecs, link. Acedido em 07/05/2019.

[17] Cheaper bandwidth or bust: How Google saved YouTube, link. Acedido em 07/05/2019.

[18] YouTube by the Numbers: Stats, Demographics & Fun Facts link. Acedido em 10/05/2019.

[19] Youtube Growing Fast than Thought: Report Says, link. Acedido em 07/05/2019.

[20] How Does YouTube Make Money? YouTube Business Model In A Nutshell, link. Acedido em 06/05/2019.

[21] YouTube’s Ad Revenues May Hit $5.6 Billion In 2013, link. Acedido em 11/05/2019.

[22] https://support.google.com/youtube/answer/2797466?hl=en. Acedido em 11/05/2019.

[23] YouTube Content ID, link. Acedido em 12/05/2019.

[24] What is a Content ID claim?, link. Acedido em 12/05/2019.

[25] How Content ID works, link. Acedido em 12/05/2019.

[26] What is fair use?, link. Acedido em 12/05/2019.

[27] https://creativecommons.org/licenses/by/3.0/legalcode. Acedido em 12/05/2019.

[28] https://support.google.com/youtube/answer/2797468?hl=en. Acedido em 12/05/2019.

[29] 12 Best Types of YouTube Content To Succeed at Growing a YouTube Channel, link. Acedido em 19/05/2019.

[30] Frequency of encountering false, untrue or dangerous video content on YouTube according to users in the United States as of June 2018, link. Acedido em 12/05/2019.

[31] The Life of a Flag, link. Acedido em 18/05/2019.

[32] https://transparencyreport.google.com/youtube-policy/removals. Acedido em 12/05/2019.

[33] https://transparencyreport.google.com/youtube-policy/flags. Acedido em 12/05/2019.

[34] YouTube takes ads off 'anti-vax' video channels, link. acedido em 17/05/2019.

[35] Hate speech policy, link. Acedido em 17/05/2019.

[36] 60% Of YouTube Views Come From A Non-English Speaking Audience, link. Acedido em 12/05/2019.

[37] http://www.businessofapps.com/data/youtube-statistics. Acedido em 18/05/2019.

[38] https://www.youtube.com/saveyourinternet/. Acedido em 12/05/2019.